Projeto Memória homenageia João Cândido, no Dia da Consciência Negra
Fundação Banco do Brasil associa vida do Almirante Negro à luta dos direitos humanos
Brasília, 21 – Foram 15 anos de luta para que a estátua de João Cândido Felisberto, o Almirante Negro, finalmente, fosse erguida numa praça, no Rio de Janeiro. Concebida pelo artista plástico Walter Brito, a obra foi transferida dos jardins do Museu da República para a Praça XV, no evento que marcou o feriado de Zumbi dos Palmares, ontem (20).“Hoje, eu e minha família, com muita emoção, após 97 anos dos acontecimentos de 1910, vemos erguido esse monumento exatamente em frente à baía da antiga Guanabara, onde meu pai gritava ‘chega de violência, abaixo a chibata e viva a democracia!’. Ao lado do munumento, vejo, com muita alegria, o entreposto de pesca onde meu pai trabalhou durante 40 anos para o sustento da sua família”.
A fala de Adalberto Nascimento Cândido, filho de João Cândido, foi ouvida por todos os que celebraram a Consciência Negra, na Praça XV. A data e local também foram escolhidos pela Fundação Banco do Brasil para lançar a 11ª edição do Projeto Memória, que, neste ano, tem como tema “João Cândido e a luta pelos direitos humanos”.
Presente no evento, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu a importância de transformar o Dia da Consciência Negra em feriado nacional. “Hoje, no Brasil, 350 cidades já decretaram o feriado e seria importante transformá-lo em data nacional. Em 2006, eram 225 cidades, hoje são 350 e, certamente, elas são as mais importantes do país”, disse.
“O povo brasileiro precisa conhecer as causas pelas quais as pessoas lutavam e pelas quais morreram, porque somente assim vamos criar uma consciência política na nossa juventude”, acrescentou Lula.
Dívida história - O ministro da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Edson Santos, lembrou da anistia concedida a João Candido pelo presidente Lula, em julho de 2008. “A anistia resgatou uma dívida histórica para com a população negra. Precisamos, no entanto, refletir sobre os muitos passos que teremos que dar para que o Brasil venha a ser, efetivamente, uma nação de iguais, e a educação seja o principal instrumento de inclusão e de promoção da cidadania”.
A comemoração teve início às 14h e seguiu noite adentro com apresentações musicais de nomes importantes do samba, como Dona Ivone Lara, Neguinho da Beija Flor e Martinho da Vila. O compositor João Bosco, que homenageou João Cândido com a pérola Mestre-Sala dos Mares, também participou.
Para o presidente da Fundação Banco do Brasil, Jacques Pena, a escolha de João Cândido como homenageado deste ano é um marco. “É a primeira vez que um negro ocupa a posição. Temas como escravidão, monocultura e latifúndio, ligados à sociedade da época, e com reflexos no Brasil de hoje, voltarão a ser discutidos por meio do estudo da vida e lutas de João Cândido”, afirma.
Acervo - O Projeto Memória inclui uma exposição itinerante em 800 municípios brasileiros e a produção de vídeo-documentário e livro foto-biográfico. As obras serão distribuídas para 5,3 mil bibliotecas públicas do país. Além disso, um kit pedagógico, com almanaque histórico e guia do professor, também serão editados e enviados a 18 mil escolas públicas. O projeto contará, ainda, com uma página na internet sobre a vida e a luta do almirante negro.
João Cândido defendeu, no início do século passado, melhores condições de trabalho para os marujos e a abolição de castigos corporais na Marinha. Apesar de a luta ter redundado no compromisso do Governo Federal em abolir os castigos aos marinheiros, João Cândido foi expulso da corporação. O marinheiro trabalhou até o fim da vida, na Praça XV, descarregando peixes de navios.
Desenvolvido desde 1997 pela Fundação BB, em parceria com a Associação Cultural do Arquivo Nacional e a Petrobras, o Projeto Memória resgata a história de personalidades que defenderam a inclusão social no Brasil, de forma a preservar a vida, o pensamento, a obra e os fatos marcantes que contribuíram para a transformação social e a construção da cultura brasileira.
Nove personagens já foram tema do Projeto Memória desde então: o poeta Castro Alves, o escritor Monteiro Lobato, o jurista Rui Barbosa, o navegante Pedro Álvares Cabral, o ex-presidente Juscelino Kubitschek, o sanitarista Oswaldo Cruz, o sociólogo Josué de Castro, o educador Paulo Freire e a feminista Nísia Floresta.