Para enfrentar o atual momento, na análise de Standing, é preciso ter medida de segurança para compensar as causas após os fatos e evitar a fragmentação de classes.
Já o economista Marcelo Neri utilizou o futebol como parâmetro para falar sobre a evolução da pobreza no Brasil pré e pós crise. “Tivemos uma queda excepcional de desigualdade social de 49%, entre 2001 e 2008” - lembrou o coordenador do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas. E completou: “De junho de 2008 a junho de 2009, estamos parados, no empate”, o que significa redução de 0,4%. Para ele, os dados são importantes e mostram que os mais pobres não foram afetados diretamente pela crise. “Estamos no País do futebol, mas o empate, nessas circunstâncias [de crise econômica], é um ótimo resultado se olharmos para o resto do mundo”.
Ao falar sobre pobreza e desigualdade na perspectiva do Índice de Desenvolvimento Humano, o economista Flávio Comim, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, afirmou que a atual crise mundial não é apenas financeira, mas uma crise de valores. “Nos estudos que estamos fazendo para o próximo relatório de desenvolvimento humano brasileiro, que entrevistou meio milhão de pessoas sobre o que elas necessitavam para melhorar de vida, o principal problema detectado foi o da falta de valores”.
As palestras de hoje foram mediadas pelos ministros Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência), Paulo Bernardo (Planejamento), Tarso Genro (Justiça). A cobertura completa do evento, com as principais informações de cada palestrante, está no Portal do MDS na internet: HYPERLINK "http://www.mds.gov.br/"www.mds.gov.br.
Mudanças globais - Que políticas públicas necessitamos e para qual crise? Essa é a reflexão que governos e sociedade precisam fazer para obter desenvolvimento e oferecer proteção e bem-estar social, a partir de um novo cenário. Este foi o foco da palestra do espanhol Joan Subirats, da Universitat Autònoma de Barcelona. Na opinião do especialista, é preciso refletir sobre que respostas podemos ter no âmbito das políticas públicas, com todas as mudanças globais que estão surgindo. “O Estado, há algumas décadas, era parte do problema e não da solução”, observou.
Na visão do economista Fernando Filgueira, da Universidade Católica do Uruguai, o modelo de proteção social implantado na América Latina ainda não conseguiu dar respostas adequadas às demandas da população, em especial as mais pobres, e também não deu conta de acompanhar as transformações sociais sofridas pela sociedade latinoamericana. Para ele, “há um divórcio recente e histórico entre a estrutura da sociedade latinoamericana e a matriz de proteção social”. De acordo com Filgueira, as transformações do mercado de trabalho, com o incremento da informalidade e do desemprego, se desencontram com as reformas da Seguridade Social nos anos 90, exceção feita ao Brasil. “O Brasil é um caso atípico, não privatizou a sua previdência social. Parte dos bons resultados que o País apresenta hoje tem a ver com um conjunto de medidas tomadas, no passado, nesse setor”.
Mercado de trabalho - Sobre o Bolsa Família, programa do Governo Federal coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Marcio Pochmann, economista e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), afirmou que este “é um esforço que se faz na construção de outro Estado”, e ele aponta a diminuição da desigualdade de renda como um dos pontos fundamentais para a evolução do Estado brasileiro. Outro assunto abordado pelo presidente do Ipea foi a entrada precoce no mercado de trabalho. “Pessoas de baixa renda acabam entrando no mercado de trabalho muito cedo. Enquanto isso, o filho do rico entra apenas depois dos 25 anos. Dessa forma, ele está muito mais capacitado do que o pobre, que, por ter começado a trabalhar por volta dos 18 anos, não tem estudo, pega os piores empregos e com os piores salários.” Para Pochmann, atualmente, na era da informação, é necessário prezar pelo estudo, se preparando para o mercado e continuar estudando enquanto estiver nele.
O diretor geral da Citties Alliance, Willian Cobbett, destacou alguns pontos que em sua avaliação são de suma importância para superar o desafio do crescimento desordenado das cidades: os responsáveis pela decisão devem estruturar a urbanização; planejar a longo prazo; monitorar o deslocamento laboral da população. Além disso, os serviços devem ser estendidos a todas as áreas da cidade e deve-se criar instituições idôneas para deliberar sobre as decisões sobre o crescimento da cidade. Cobbett foi enfático sobre a extensão dos serviços a todas as áreas das cidades. “Se os mais pobres não tiverem acesso aos serviços de forma legal, eles chegaram ilegalmente e de forma muito cara, tanto do ponto de vista econômico quanto do social”, enfatizou.
Direito humano - “Alguns mitos atuam como verdadeiras máquinas de exclusão social nas grandes cidades. Entre eles, a idéia de altas taxas de migração, da falta de controle da natalidade por parte da população e de que há escassez de trabalho”. A declaração é de Raquel Rolnik, relatora internacional do Direito à Moradia Adequada do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Rolnik esclareceu que todos os estudos e evidências apontam que há muitos casos de pessoas que estão há décadas no mesmo lugar, em condições de extrema pobreza, como nas favelas do Rio de Janeiro. Ela assegura, ainda, que a população pobre já realiza um controle geral de natalidade e que temos um modelo de organização urbana que não reconhece como trabalho a função dos catadores de lixo e dos camelôs, por exemplo. “O neoliberalismo afastou a idéia de moradia como direito humano e transformou política urbana em comércio”, enfatizou a relatora.
O diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Francisco Menezes, afirmou que “não devemos aceitar a falácia de gasto” quando se investe no social. “Não tem passe de mágica, não são recursos pequenos. É preciso recursos vultosos para o social”, ressaltou. No debate, Chico Menezes relatou um episódio recente: ao ler um jornal, se deparou com uma manchete com viés crítico - “Gastança em momento de crise”. Menezes conta que foi verificar o que era essa “gastança” - justamente o social que, segundo ele, pelo contrário, foi a área que fez o Brasil sair mais rápido da crise.
Já o cientista político da Índia, Harjit Singh Annand, falou da incerteza como um marco na vida do pobre e que é vital que devemos saber o que fazer com essas pessoas, numa abordagem baseada em direito e não em caridade. “Muitos pobres podem ser produtivos”, completou. Annand mostrou que a maioria dos pobres está empregado no setor informal. “Quando examinamos o capital social, temos uma diversidade de ocupações sem qualificação; alto índice de analfabetismo, principalmente de mulheres; alto nível de desnutrição e subempregos”. Ele citou que cerca de 1/3 a 1/5 das populações de países em desenvolvimento estão abaixo da linha da pobreza e o problema é que as cidades não conseguem atender esses cidadãos: “faltam serviços básicos, como por exemplo, o acesso a água”.
Agenda - Nesta sexta-feira (7), pela manhã, modelos de proteção social adotados em países como a África do Sul, Indonésia, Brasil e Chile serão apresentados no último dia Simpósio Internacional sobre Desenvolvimento Social, organizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) em Brasília. A proposta é mostrar as experiências e apontar perspectivas aos países em desenvolvimento no momento de pós-crise. No evento, há participantes de 36 países, representantes de 14 organismos internacionais, de 16 embaixadores e 13 palestrantes estrangeiros.
João Luiz Mendes
ASCOM / MDS
(61) 3433-1021
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