Conferência Global sobre Trabalho Infantil

 

Haia, 10 de maio de 2010

Márcia Helena Carvalho Lopes

Ministra de Estado do Desenvolvimento Social e Combate à Fome - Brasil

Agradeço ao Ministério de Assuntos Sociais e Emprego da Holanda e à Organização Internacional do Trabalho (OIT) pelo convite para participar desta Conferência.

Sinto-me muito honrada de estar aqui em Haia liderando a delegação Brasileira nesta Conferência Global sobre Trabalho Infantil 2010 “Em Direção a um Mundo sem Trabalho Infantil: mapeando o caminho até 2016”.

O tema em pauta não poderia ser mais pertinente. Temos que reafirmar nosso engajamento e definir as estratégias para cumprirmos o compromisso estabelecido em 1999 pela Convenção 182 da OIT (ratificada pelo Brasil em 2001) de livrar o mundo da chaga do trabalho infantil em suas formas mais degradantes até 2016 e continuarmos avançando para sua erradicação completa.

Parabenizo a OIT pela competente atuação na prevenção do trabalho infantil e em defesa do trabalho decente e produtivo, em condições de liberdade, equidade, segurança e de dignidade humana.

Ressalto que o Estado Brasileiro também partilha do princípio da OIT de que a paz universal e permanente só pode estar baseada na construção e conquista da justiça social.

O objetivo de erradicar o trabalho infantil está diretamente associado à defesa e ao respeito ao “Tempo da Infância”. Trata-se de um tempo de Direitos - a criança tem o direito de brincar, explorar o mundo à sua volta, estudar –enfim, ser criança, com proteção integral.

É nosso dever não somente prevenir que nossas crianças adentrem o mundo do trabalho antes da hora, mas também garantir que eles tenham a oportunidade de aproveitar essa fase tão importante da vida e se preparar para uma vida adulta plena.

Durante muito tempo, o Estado e a sociedade brasileira não se engajaram em combater com a energia necessária a mazela do trabalho infantil, em especial suas formas mais degradantes.

Hoje, a proteção e o cuidado com as crianças e adolescentes é uma política de Estado no Brasil, sendo um dos pilares centrais de nossa Constituição, promulgada em 1988.

As leis que regem as relações trabalhistas no setor privado no Brasil garantem uma série de proteções especiais aos trabalhadores entre 14 e 18 anos de idade, como a proibição do trabalho em locais prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, e em horários e locais que impeçam sua frequência escolar. Entre 14 e 16 anos, só é permitido o trabalho na condição de aprendiz, regulada pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

A absoluta prioridade constitucional conferida à proteção da infância foi regulamentada em 1990 com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente pelo Congresso Nacional Brasileiro.

O Estatuto prevê um Sistema de Garantia e de Proteção de Direitos das crianças e dos adolescentes, definindo como implementá-los, a quem cabe garanti-los e estabelecendo um sistema de denúncias para situações de violação.

Estou certa de que o Estatuto mudou a percepção e os valores da sociedade brasileira, proporcionando uma plataforma legal para a sociedade civil demandar ações efetivas do Estado, com a implementação de políticas públicas, financiamento adequado e controle social.

Impulsionado por esse movimento, em 1994, é criado o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e em 1996 o governo federal criou o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI).

Ele articula um conjunto de ações – benefícios financeiros, ações socioeducativas, dentre outras - visando retirar crianças e adolescentes da prática do trabalho precoce, mantendo-as na escola e em atividades complementares às suas necessidades.

No governo do Presidente Lula, a partir de 2003, o combate ao trabalho infantil é elevado à condição de meta presidencial. Essa decisão política se concretizou, no Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, de 2004, como resultado de um intenso trabalho entre governo e sociedade civil, realizado no âmbito da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil.

Em 2008, o Presidente Lula publica o decreto que regulamenta a Convenção 182 da OIT, listando as piores formas de trabalho infantil e estabelecendo ações imediatas para sua eliminação, o que tem exigido estratégias de gestão do estado, dos movimentos sociais e do setor privado

Temos a convicção de que não vamos erradicar o trabalho infantil pela atuação de um programa ou de seus defensores. É preciso incorporar de forma determinada, no cotidiano, como meta prioritária e compromisso ético e político dos governos, da sociedade organizada, dos empregadores, trabalhadores e das próprias famílias. Agir com rigor e coragem para mudar o padrão tradicional de desenvolvimento econômico, social e cultural dos países.

Neste sentido, o governo brasileiro decidiu enfrentar duas graves conseqüências da sua história, desde a colonização: a pobreza e a desigualdade social, onde o estado deve ser o provedor de políticas públicas garantidoras de direitos e de caráter universais, de qualidade, e respeitando a diversidade étnico, racial e de gênero presente no território brasileiro.

Um novo paradigma de sistemas públicos universais tem orientado as ações do nosso governo, criando, por exemplo, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, com a responsabilidade de implantar dois sistemas de políticas públicas: o Sistema Único da Assistência Social (SUAS) e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN). Ambos estruturam a rede de proteção social.

O Ministério coordena ainda o maior programa de transferência de renda do mundo, o Bolsa Família, que interage fortemente com esses dois sistemas e atende hoje 12,4 milhões de famílias pobres, cerca de 50 milhões de pessoas.

O Bolsa Família garante renda básica às famílias pobres e extremamente pobres, garantindo acesso a saúde, assistência social e a permanência na escola, por meio do acompanhamento das condicionalidades.

Um grande passo para aprimorar o diagnóstico do trabalho infantil e localizar as crianças foi a criação de um campo específico no Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal para permitir a identificação das crianças em situação de trabalho infantil.

Tal iniciativa – em 2006 - permitiu a integração do PETI ao Programa Bolsa Família, atendendo hoje 820 mil crianças e adolescentes, afastados do trabalho em 3.520 municípios.

Entre outras políticas públicas, uma dimensão chave para proteger as crianças do trabalho e propiciar seu desenvolvimento pleno é a educação.

O Brasil tem apresentado significativos avanços nessa área. O acesso ao ensino fundamental está praticamente universalizado. A taxa líquida de matrículas na faixa etária de 7 a 14 anos é de 95%, sem diferenças significativas nas distintas faixas de renda.

Recentemente o ensino no Brasil passou a ser compulsório na faixa de 4 a 17 anos.

Contudo, temos ainda um grande desafio para incluir e manter no sistema educacional os adolescentes de 15 a 17 anos. Nesta faixa etária, o acesso e a permanência na escola variam muito de acordo com a renda.

Assim, uma das estratégias foi a ampliação do Programa Bolsa Família para adolescentes de 15 a 17 anos, integrando outras ações intersetoriais.

O Governo Lula ampliou e aprimorou as ações voltadas para a juventude com o ProJovem, um programa interministerial voltado para o público de 15 a 29 anos, que já beneficiou mais de um milhão de jovens.

Coordenado pelo Ministério, o ProJovem Adolescente é voltado para jovens de 15 a 17 anos de famílias beneficiárias do Bolsa Família e jovens vinculados ou egressos de outros serviços sócio assistenciais, como combate ao abuso e exploração sexual e ao trabalho infantil. A meta é atender 850 mil jovens até o final de 2010.

Há programas também nas áreas de cultura e esporte que alcançam mais de 9 milhões de jovens.

Assim, o Governo do Presidente Lula tem implementado um modelo de desenvolvimento que supera a falsa dicotomia entre o crescimento econômico e social.

A inclusão social, o combate à fome, à pobreza e à desigualdade, expressos na estratégia Fome Zero, tornam-se vetores fundamentais para o desenvolvimento nacional, além de contribuírem para dinamizar a economia nacional, ao ampliar nosso mercado interno. Esta ampliação foi determinante para reduzir os impactos da crise econômica mundial.

O expressivo aumento de recursos para as ações realizadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que passaram de 6 bilhões de dólares em 2003 para 21 bilhões de dólares em 2010 – demonstra a decisão do Presidente Lula por um modelo de desenvolvimento inclusivo.

. A economia do Brasil vem crescendo, com distribuição de renda. Pela primeira em 40 anos tivemos uma queda expressiva da desigualdade social. Estamos próximos a erradicar a fome e a pobreza extrema. Em 1990, 26,8% dos brasileiros tinham renda domiciliar per capita abaixo da linha de pobreza extrema definida para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).

Em 2005, o país atingiu com dez anos de antecedência a Meta 1, tendo reduzido para metade a proporção de pessoas em situação de pobreza extrema observada em 1990 e estabeleceu para si a meta de reduzir para um quarto.

Em 2008, o número de brasileiros abaixo da linha da extrema pobreza foi reduzido para 4,8%, ou seja, menos de um quinto do verificado em 1990, superando a meta autoestabelecida pelo Brasil.

O Brasil também atingiu a meta de reduzir a fome à metade e se comprometeu a erradicá-la até 2015. Análises do estado nutricional de crianças de 0 a 4 anos revelam que o país está próximo de erradicar a desnutrição na infância. De 2003 a 2008, a desnutrição infantil caiu 73% e a mortalidade infantil diminuiu 15,3%.

O trabalho infantil vem caindo no Brasil como resultado da redução da pobreza e da desigualdade e das ações específicas para seu enfrentamento.

A taxa de trabalho infantil entre 5 a 15 anos passou de 13,6 em 1992 para 5,8 em 2008. De 2007 a 2008, cerca de 350 mil crianças nessa faixa etária deixaram de trabalhar.

Mas ainda temos desafios importantes a superar, como o trabalho informal doméstico e rural, além da exploração sexual.

A grande diversidade dos 5564 municípios brasileiros, de diferentes portes demanda uma articulação local com Estados e Municípios. É necessário reconhecer tais especificidades e desenvolver estratégias de gestão integradas para cada situação concreta.

É preciso ainda romper com a visão conservadora de que o trabalho infantil é uma possibilidade de aprendizado e de ascensão social, e continuar fomentando o pacto nacional em defesa da erradicação do trabalho infantil e dos direitos das crianças.

Termino ratificando o compromisso do Governo Brasileiro com o desafio mundial de erradicação do trabalho infantil.

Por meio da cooperação Sul-Sul, estamos realizando projetos de desenvolvimento social com países da África, América Latina, Caribe e Ásia, visando contribuir para a redução da pobreza e a erradicação da fome e do trabalho infantil no cenário internacional.

O desafio compartilhado por nós nesta Conferência só será atingido com a participação de todos: dos governos, das organizações da sociedade civil e da comunidade internacional.

Estou convicta de que este evento cumpre mais uma vez a determinação da nossa luta e da mobilização por um mundo livre do trabalho infantil.

Não há mais espaço para crianças fora da escola.

Não há mais espaço para crianças sem cuidado e proteção.

Não há mais espaço para crianças relegadas a qualquer tipo de violação dos seus direitos, privadas do tempo da infância.

Criança tem direito de ser criança.

Muito Obrigada!


   
Assessoria de Imprensa do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Tel.: (61) 3433-1021