“Os quilombolas agora têm voz”, diz líder comunitária de Angico (PE)

No Dia Nacional da Consciência Negra, 20 de novembro, a presidente da Associação Quilombola de Angico (PE), Maria Márcia Rodrigues de Almeida, é um exemplo da luta dos negros em busca de seus direitos. Para ela, os programas sociais do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) garantem uma vida mais digna aos quilombolas, mas reforça que a questão da terra e da saúde ainda são precárias

 

Fotos: Ana Nascimento / MDS  

Foto Esquerda: Maria Almeida, líder comunitária da comunidade quilombola de Angico, em frente ao muro da escola que leva o nome de sua mãe

Foto Direita: O quilombo de Angico existe há cerca de 300 anos. Ali vivem cerca de 220 famílias.

Maria Márcia Rodrigues de Almeida mora na comunidade quilombola de Angico - Município de Bom Conselho (PE) – e, como outros moradores, luta para fazer valer os seus direitos. Altiva, de olhar sério e um sorriso acolhedor para todos que cruzam seu caminho, Márcia nasceu ali há 37 anos. Perdeu a mãe há muito tempo e, hoje, mora com o pai e um dos três irmãos numa casa humilde, de fachada verde, cercada por galinhas, cachorros e o já tradicional carro de boi, comum na região. Ela acredita que herdou da mãe, a parteira Doralice Rodrigues da Silva, a garra e a vontade de trabalhar pelo seu povo.

“Uma das duas escolas da comunidade tem o nome de minha mãe. Isso foi decidido pelos próprios moradores daqui e votado na Câmara Municipal”, diz orgulhosa. O compromisso de Márcia com o povo quilombola pode ser comprovado no movimento constante de parentes e amigos da vizinhança durante todo o dia em sua casa. Ao lado da pequena construção, uma singela igreja em homenagem a Nossa Senhora Aparecida. À noite, a igreja vira escola e recebe adultos da região. É nela também que são guardados os litros de leite adquiridos por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), que são distribuídos, duas vezes por semana, a 70 famílias.

Incansável - Percorrer os cerca de 130 hectares de terra de Angico, com Márcia ao volante de um velho automóvel, é uma experiência ímpar. Na estrada de terra, pouco mais larga que um veículo de médio porte, muitos buracos, pedras, alguns carros de boi e animais soltos. Parando de casa em casa, abrindo e fechando porteira, pulando arame farpado, lá vai ela. Conhece todo mundo e seus problemas. Seu trabalho incansável é reconhecido pelas famílias do quilombo. Ouve as reivindicações de cada um e promete encaminhá-las e resolve-las. “Pode deixar que eu vou ver isso”. A mesma resposta que é dada, pessoalmente, é dita pelos celulares. Márcia tem dois que tocam a todo minuto.

Presidente da Associação Quilombola de Angico e membro da Comissão das Comunidades Quilombolas do Estado de Pernambuco, Márcia, que também é bióloga, agora quer cursar Serviço Social. Sonha que aqueles que nasceram no quilombo permaneçam na terra para a preservação da cultura.

A líder comunitária presta também assessoria ao Territórios da Cidadania - programa do Governo Federal que envolve 22 ministérios, entre eles, o MDS, com o objetivo de integrar políticas para o desenvolvimento da região.

“Acho que a educação é o caminho para ajudar a comunidade e garantir o seu espaço”, enfatiza Márcia, que já trabalhou na roça e caminhava, diariamente, oito quilômetros até a cidade para estudar. Deu aula por 15 anos, tendo sido, inclusive, diretora de uma das escolas. “O primeiro relógio que comprei foi colhendo algodão, por isso sei que é difícil passar o dia inteiro na roça e à noite ir para a escola”, conta.

Para Márcia, hoje o povo quilombola tem voz e discute as suas necessidades com governo e sociedade civil, o que considera uma verdadeira conquista.

Compromisso - “Márcia, diz aí pra moça o meu nome todo que não sei não”, pede uma das mais antigas moradoras do quilombo quando lhe pergunto seu sobrenome. E é sempre assim. Para a comunidade, Márcia é porto seguro e a certeza de dias melhores e, nela, todos depositam sua confiança.

A líder comunitária destaca a importância dos programas sociais na melhoria da qualidade de vida dos moradores do local. “Entre outras coisas, conseguimos 60 cisternas. Antes, a gente não tinham onde pegar água”, mas reforça que terra, saúde e a discriminação são os principais desafios que o povo quilombola enfrenta.“Ainda somos discriminados por sermos negros e por lutarmos por nossos direitos sem arredar o pé. A partir do momento que vejo outras pessoas engajadas nessa luta, com aquela visão de construção, fico muito feliz”, assegura.

Essa mesma mulher, jovem e determinada, cai em prantos quando pergunto porque ela permanece na comunidade mesmo enfrentando tantas dificuldades. “Já tive oportunidade de sair daqui mas sou apaixonada pelo que faço e não tenho coragem de abandonar os meus. Eu seria covarde agindo dessa forma”, relata, entre lágrimas.

Programas sociais – No quilombo de Angico, 125 famílias são beneficiárias do Programa Bolsa Família do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. No Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) estão 45 crianças e adolescentes. São 18 rapazes e moças no Projovem Adolescente com aulas de informática, entre outras atividades. Segundo dados locais, o quilombo de Angico existe há cerca de 300 anos. Ali vivem cerca de 220 famílias. Em 2007, o censo realizado pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) apontou 1.004 pessoas vivendo no quilombo.

Em todo o Brasil, há 23 mil famílias quilombolas beneficiárias do Bolsa Família e 277 Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) que atendem essa parcela da população. As comunidades quilombolas também são atendidas nos programas de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), Construção de Cisternas , Cestas de Alimentos e Inclusão Socioprodutiva.

Dia da Consciência Negra - Celebrado em 20 de novembro no Brasil, o Dia da Consciência Negra é dedicado à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira. A data foi escolhida por coincidir com o dia da morte de Zumbi dos Palmares, em 1695, e marca a resistência do negro à escravidão, desde o primeiro transporte forçado de africanos para o solo brasileiro, em 1594.

Os quilombolas são descendentes dos escravos africanos trazidos para o País por colonizadores europeus. Os primeiros quilombos reuniam escravos fugidos das grandes fazendas, que se organizavam em comunidades para a subsistência. A Constituição de 1988 prevê no Artigo 68 o reconhecimento, a delimitação e a titulação das terras dos quilombolas.

Ana Soares

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